15 de novembro de 2010

ENTREVISTA: Francisco Seixas da Costa

"E se fossem criadas embaixadas ibéricas em Madrid?"

por HUGO FILIPE COELHOHoje
"E se fossem criadas embaixadas ibéricas em Madrid?"
No dia em que Luís Amado vai ao Parlamento discutir o Orçamento de austeridade e apontar o sentido da reforma da rede diplomática, Francisco Seixas da Costa, o embaixador português em Paris, avisa contra os riscos de se encerrar embaixadas e justifica o investimento  na diplomacia. E mostra-se muito atento ao desenvolvimento da crise.

O Governo está a ultimar uma reforma da rede diplomática. Considera-a oportuna?
Como diplomata, considero essencial uma atenção constante ao equilíbrio entre os interesses que Portugal tem a defender na área externa e a dimensão e a qualidade da nossa rede. Todos percebemos bem que, num contexto restritivo, há que ter um ainda maior rigor no dispêndio que é feito nesse domínio. Não é por acaso que outros Estados têm também em curso processos de redimensionamento das suas redes diplomáticas.
A que questões deve responder?
O essencial é que a rede diplomática possa ter a densidade necessária para garantir, com eficácia, a defesa dos nossos interesses (políticos, comunidades, económicos, culturais), que assegure uma participação activa na política europeia, nos compromissos em matéria de segurança e defesa, no espaço de expressão portuguesa e conjunturalmente, nas responsabilidades decorrentes da nossa presença no Conselho de Segurança da ONU.
Teme uma mudança precipitada pela exigência de apertar o cinto?
Estou certo que, embora tendo como pano de fundo esse inevitável cenário, as decisões que vierem a ser tomadas tenderão a preservar os instrumentos necessários para garantir os nossos interesses e o prestígio de Portugal na ordem externa.
Como é que um embaixador explicaria a um cidadão comum o sentido de Portugal ter 77 embaixadas pelo mundo - pagar casa e sustentar a família de 264 diplomatas - na era da informação instantânea?
Sabia que o número de diplomatas portugueses tem vindo a baixar drasticamente ao longo dos últimos anos? As nossas embaixadas têm estruturas já muito leves, os nossos serviços centrais estão mesmo descapitalizados em termos de recursos humanos. Por que razão Portugal foi eleito para o CS da ONU? Teria isso sido possível se tivéssemos uma minúscula rede diplomática? Portugal é um dos mais antigos países do mundo, temos uma história e um património de relações internacionais que faz parte da nossa própria identidade como país. Temos muito interesses externos a defender, materiais e não só, e os diplomatas são os "advogados" externos desses nossos interesses.
Manuel Maria Carrilho, ex-embaixador junto da UNESCO, desafiou José Sócrates fechar uma embaixada em cada cinco pela fusão de que estão num mesmo país e pelo recurso a embaixadores itinerantes. São propostas viáveis?
O número de missões diplomáticas ou consulares de um país depende exclusivamente daquilo que disse no início: da manutenção da capacidade para defender os nossos interesses. A ideia da fusão de postos é teoricamente apelativa, mas é preciso avaliar se isso é exequível sem perda de eficácia. Quanto aos "embaixadores regionais", que diria Portugal se alguns tentassem criar "embaixadores ibéricos", sediados em Madrid?
Outra proposta de Carrilho é que os diplomatas passem a pagar impostos sobre os abonos "representação" que recebem no estrangeiro, para além do seu salário de Lisboa?
Não vejo qualquer inconveniente, desde que, naturalmente, e tal como se fez quando todos os funcionários públicos começaram a pagar IRS, isso seja antecedido de uma actualização. É que convém não esquecer que esses abonos de representação (onde estão as despesas para a habitação, para as escolas estrangeiras dos filhos e os seguros de saúde que a lei prevê e que, na prática, o Estado não dá), não são revistos há 16 anos! Mas mais: não vejo porque não poderíamos começar a descontar também para a Caixa Geral de Aposentações, com base nesse abono de representação.
O ministro Luís Amado anunciou o encerramento de embaixadas na Europa e a abertura de outras em outras regiões do mundo. Que sentido tem fecharmos uma missão num país do Báltico, como a Estónia, e abrirmos uma embaixada num país do Golfo, a Jordânia ou o Líbano, por exemplo?
A relação com o mundo árabe é hoje um dos eixos importantes da nossa acção externa, pelo que se compreenderá o seu reforço, se tal for economicamente viável, mesmo em detrimento de outras dimensões. Ninguém mais do que um funcionário diplomático lamenta o fecho de postos externos, mas, da mesma forma, também somos as pessoas mais bem colocadas para interpretar essas opções do poder político.
Ouve-se cada vez mais falar de diplomacia económica. Um conceito que justificou a aproximação polémica a países como a Líbia de Kadhafi ou a Venezuela de Hugo Chávez. Que frutos colhemos disto?
Frutos? Veja-se para os números do nosso comércio externo com esses países e logo verá que há todas as razões para justificar a atenção nesses mercados. A economia está na matriz da nossa acção diplomática, desde sempre. Talvez se "ouça" agora mais porque, de facto, a nossa diplomacia tem vindo a ajudar cada vez mais os nossos operadores, um pouco por todo o mundo.
O corpo diplomático é muitas vezes visto como uma corporação no seio do Estado intocável e cheia de privilégios. É um preconceito? Com um fundo de verdade?
Costumo dizer que a psicologia do despeito ajuda a explicar muito desse preconceito. O diplomata é um funcionário público expatriado, às vezes para muito longe, com impactos negativos para a profissão dos cônjuges, questões escolares dos filhos, separação das famílias, etc. Eu vivo actualmente em Paris (mas também já vivi em Luanda, com guerra e recolher obrigatório...), mas muitos dos meus colegas residem em cidades com insegurança, com climas insalubres, com dificuldades de assistência 
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Esta noticia foi extraida do Diario de Noticioas
do dia de 15/11/2010

Parabens ao meu estimado cliente Sr. Emb. Francisco Seixas da Costa

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