15 de agosto de 2014




Barbeiro 1

Cave do Apolo 70 acolhe Museu dos Barbeiros e Cabeleireiros

Escondido no piso subterrâneo do clássico centro comercial do Campo Pequeno, o Museu dos Barbeiros e dos Cabeleireiros mostra navalhas, lâminas, tesouras e bacias, entre outros objectos. Um muito peculiar acervo, no qual se conta uma navalha que fez a barba ao rei Dom Carlos. Abriu no princípio do ano, mas poucos o conhecem.

Texto: Francisco Neves

Tirando a clientela, alguns turistas dos hotéis das redondezas e alunos de cursos profissionais, são poucos os que conhecem este museu discreto e original. Fica numa cave do centro comercial Apolo 70 – o primeiro a abrir em Lisboa – e só um pequeno anúncio na montra da Avenida Júlio Dinis dá conta que ali se pode visitar o Museu dos Barbeiros e Cabeleireiros.

O museu abriu no princípio do ano graças a Joaquim Pinto, um barbeiro bem sucedido e que ama a profissão, a que se entregou quando tinha 19 anos. Veio de São Martinho de Mouros, localidade muito antiga do concelho de Resende (Lamego), para Lisboa, onde aprendeu a profissão.

Joaquim abriu a sua barbearia, primeiro, em Moscavide. E ainda fala com simpatia dos clientes dessa altura. Passou há 38 anos para o Apolo 70 e hoje trata das cabeças de gente muito conhecida.

“A profissão de barbeiro é muito bonita. Foi a minha paixão desde pequenino. O barbeiro – que antigamente era também sangrador e dentista, que chegava a fazer pequenas cirurgias – tinha uma certa importância na vida social dos camponeses. Eu dava-me conta disso. Mas há que ter uma certa dose de humildade. E é preciso estudar muito bem o cliente, tentar percebê-lo, ver, por exemplo, se quer ter um barbeiro que converse com ele ou não. No barbeiro há uma relação amiga e confidencial com o cliente”, descreve.

Barbeiro 2
Cadeira usada por um barbeiro dentista, noutros tempos.

Joaquim Pinto começou por ser coleccionador. O hábito começou quando, em 1969, alguém da administração da construtora J. Pimenta lhe ofereceu umas navalhas com lâmina substituível. “Comecei logo a usá-las em vez das outras”, conta ao Corvo, recostado no cadeirão de uma sala privada, enquanto a pedicura da casa lhe corta as unhas. “É que vou de férias”, explica.

As navalhas de barbeiro tornaram-se o seu grande interesse há 30 anos e hoje tem mais de trezentas. Lá está uma que fez a barba ao rei Dom Carlos.

Depois, foi um acumular de objectos, mais ou menos complexos, que dão uma ideia da evolução desta prática tão antiga. São tesouras, afiadores, ferros de enrolar cabelos e bigodes, as primeiras giletes (1890) e máquinas de corte, bacias de barbeiro (uma delas da Companhia das Índias). Para os exibir alugou mais uma loja do centro comercial, no mesmo piso do salão onde trabalha.

Duas grandes cadeiras dominam o cenário, uma delas, em couro vermelho, ainda do tempo em que os barbeiros eram dentistas. A prática foi legalmente proibida em 1870, mas perdurou na província de modo informal. Mestre Pinto mostra também um antigo estojo portátil de higiene oral e uma rústica maleta em cortiça de um barbeiro ambulante alentejano.

Algum material do museu foi usado no salão de cabeleireiro ali ao lado. É o caso do conjunto que Joaquim Pinto usou no último corte de cabelo do ex-primeiro-ministro Sá Carneiro.
Barbeiro 3


Entre as bacias de barbear há uma da Companhia das Índias

No livro de honra do pequeno espaço é visível a assinatura de muitas personalidades sua clientela e outros visitantes ao Museu do cabeleireiro. Mas o barbeiro beirão gostaria de alargar a visibilidade do acervo que reuniu em mais de três décadas. Já foi mostrado em Paris e em Resende, por exemplo, mas para os lisboetas é quase desconhecido. “Apelei à Câmara de Lisboa, há uns dez anos, pedindo a cedência de um espaço que desse mais visibilidade ao museu. E hei-de voltar a pedir. Isto é o que consegui sozinho, mas com a colaboração municipal conseguia-se melhor”, comenta.

Sem comentários:

Enviar um comentário